sábado, 4 de julho de 2009

Adensamento urbano na Nova Luz

Esta semana, o Estadão publicou uma série de reportagens sobre o adensamento urbano em São Paulo e estudos da Prefeitura para tentar legitimar a questionada super alteração do Plano Diretor. Um destaque se deu para a região do Projeto Nova Luz (a ser ainda mais amplamente discutido aqui no blog), região que a Prefeitura pretende repassar à iniciativa privada para que esta encaminhe uma mega obra de transformação urbana. Não chamo de requalificação urbana, como gostam, porque será uma alteração profunda, com poucas construções antigas preservadas e absoluta nova funcionalização do espaço. Há uma área delimitada para construções populares e o restante será destinado a prédios para a classe média e escritórios high-tech com isensões de impostos e outros benefícios.

Discuto o projeto Nova Luz aqui, pois a área que proponho para o Museu de Arqueologia e Etnologia - MAE USP está na região delimitada pelo Projeto Nova Luz, e uma alteração profunda na região certamente influencia - positivamente, se bem encaminhada - para a proposta da Praça dos Museus na região da Luz.

O centro da proposta que faço aqui é de encaminhar a Praça dos Museus junto com a execução do Nova Luz, pois são complementares. Como o quarteirão proposto para o MAE já está inclusive demolido, seria mais fácil começar por ai a construção da Praça. Para isso, demanda-se uma cooperação entre a Prefeitura - dona da área - e o Estado e a USP. Como ambas gestões são aliadas e vem trabalhando em conjunto, poderia-se aproveitar a oportunidade para se encaminhar mais este projeto.

Edital de urbanização do Projeto Nova Luz: http://www.prefeitura.sp.gov.br/portal/a_cidade/noticias/index.php?p=30681

Link do site do Projeto Nova Luz, da Prefeitura: http://ww2.prefeitura.sp.gov.br/nova_luz/

Vamos às notícias agora...
Meta é criar adensamento recorde, chegando a 350 habitantes/hectare
Diego Zanchetta e Rodrigo Brancatelli

O edital para a contratação do projeto de concepção urbanística para a Nova Luz, lançado ontem, tem diretrizes que preveem o adensamento da região com mais 8 mil moradores. A densidade demográfica estimada para o bairro, hoje com cerca de 10 mil moradores, é de 350 habitantes por hectare após a revitalização. O índice é recorde se comparado com outros bairros de São Paulo. O distrito campeão hoje em adensamento também fica na região central: a Bela Vista, com 222 habitantes por hectare.

Para o governo municipal, o modelo de "cidade compacta" se aplica à Nova Luz. O secretário municipal de Desenvolvimento Urbano, Miguel Bucalen, acredita que 18 mil pessoas possam morar na área alvo da intervenção - 362 mil metros quadrados no polígono que inclui as Avenidas Rio Branco, Ipiranga e Duque de Caxias e as Ruas Mauá e Cásper Líbero. "O bairro conta com uma excelente infraestrutura de transportes e pode ser adensado. Temos outras quadras e partes na cidade com índices até maiores. Mas no centro, com certeza, a Nova Luz será o mais adensado", afirmou o secretário.

A paisagem que comerciantes e pedestres ainda observam pelas ruas da chamada Cracolândia, com dezenas de viciados espalhados pelas calçadas, contudo, não deve mudar tão cedo. "Se tudo ocorrer sem interrupção", segundo Bucalen, a contratação do escritório que vai fazer a concepção urbanística vai demorar dez meses. Depois é que será aberta a licitação para a contratação do consórcio que repaginará a área. O governo não divulgou valores ou previsão de término para o processo. "Ainda precisamos saber, com esse projeto de concepção, a estimativa adequada de quanto isso (concessão da Nova Luz) poderá render", argumenta Bucalen.

REOCUPAÇÃO
Dentro do objetivo de reocupar a Nova Luz, a gestão do prefeito Gilberto Kassab (DEM) quer atrair incorporadoras que receberão incentivos fiscais estabelecidos para o projeto do governo federal Minha Casa Minha Vida. Com a redução de impostos, construtoras podem, por exemplo, reduzir de R$ 80 mil para R$ 55 mil o preço de imóveis financiados para quem ganha de 3 a 10 salários mínimos.

A provável verticalização da região não significa que os atuais moradores serão desapropriados, diz o governo. "Uma das nossas diretrizes é fornecer fomentos para incentivar o morador a ficar. E queremos uma área que misture a ocupação residencial com comércios e serviços", acrescentou Bucalen.

Ermínia Maricato, professora do Laboratório de Habitação da Faculdade de Arquitetura da USP, concorda com o adensamento, mas sem mudanças drásticas. "Adensar não significa passar o trator por cima só para ter um bairro mais fashion, que possa servir no futuro só para marketing político", avalia.

As desapropriações também devem ser uma etapa custosa e demorada dentro da meta do adensamento. Segundo estudo de uma associação ligada à Fazenda Pública, feito há três anos, o custo do metro quadrado desapropriado da Nova Luz varia de R$ 500 a R$ 1.600. Cerca de 750 imóveis estão previstos para serem desapropriados em 23 quadras.

O edital lançado ontem também ratifica a diretriz, incluída pela Câmara Municipal, que determina o fomento às atividades do polo tecnológico da Santa Ifigênia. No início do ano, quando o projeto passou a ser discutido, lojistas da região temiam ser desapropriados pelo futuro concessionário.

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Prefeitura terá de investir R$ 17 mil por casa popular

Cálculo faz parte de estudo encomendado pela Prefeitura; os 3,6 milhões de m² da região central comportam 600 mil moradores
Bruno Paes Manso e Diego Zanchetta

Cada moradia nas Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis), regiões da cidade que o Plano Diretor Estratégico (PDE) definiu como locais destinados a habitações para população de baixa renda, deve demandar subsídios entre R$ 16 mil e R$ 17,3 mil. Nos 3,6 milhões de metros quadrados que vão receber esse tipo de habitação na região central, cabem 600 mil moradores - 364,8 mil com renda até seis salários mínimos e 235,9 mil com renda entre 6 e 15 salários mínimos.

Os dados são do estudo encomendado pela Prefeitura à Secretaria de Transportes Metropolitanos do Governo do Estado para subsidiar decisões de políticas públicas. Ontem, o Estado publicou que cálculos feitos no mesmo estudo apontam que a estrutura da cidade ainda tem capacidade para suportar, sem transtornos ao trânsito ou consequências ambientais, a construção de mais 23 milhões de metros quadrados nos próximos três anos.

Nos cálculos destinados à habitação popular, foram levadas em consideração somente as chamadas Zeis-3, que preveem parcerias com incorporadores imobiliários e estão localizadas na região central da cidade. É possível construir nessas áreas 91.205 habitações de interesse social (HIS) e 62.931 habitações de mercado popular (HMP). O Plano Diretor Estratégico define que em uma zona especial deve haver 40% de HIS (que atendam famílias com renda de até 6 salários mínimos), 40% de HMP (famílias com renda entre 6 e 15 salários mínimos) e 20% de uso misto.

Conforme o estudo, para a construção dessas moradias é necessário um subsídio total que varia entre R$ 1,4 bilhão e R$ 1,6 bilhão. "Deve ainda se considerar a economia que esse tipo de política pode trazer para a cidade, por colocar famílias de áreas distantes em regiões centrais, que têm excelente infraestrutura", diz o arquiteto e urbanista Cândido Malta, coordenador do estudo.

Ontem, o prefeito Gilberto Kassab (DEM) disse que aguarda receber oficialmente o estudo. O prefeito defendeu a aplicação do IPTU progressivo sobre imóveis vazios localizados em áreas de Zeis. O projeto foi apresentado na Câmara pelo líder de governo, José Police Neto (PSDB). "Na verdade ele se antecipou em algo que já foi adotado em outras grandes metrópoles do mundo para não permitir a especulação de espaços vazios", disse. Uma das Zeis que o governo pretende adensar - com mais 8 mil moradores - é a da Nova Luz, que tem área de 80 mil metros quadrados.

CORREÇÃO
Na relação publicada na edição de ontem, em vez de "potencial construtivo de escritórios em m²", o correto é imóveis não residenciais, que, além de escritórios, podem incluir indústrias e imóveis comerciais.

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Rodrigo Brancatelli

Com as diversas exigências da Prefeitura para que as empresas na licitação da Nova Luz tenham uma "notória especialização" e "larga experiência no desenvolvimento de projetos de reurbanização", conforme palavras do edital, escritórios de arquitetura de São Paulo já estão sofrendo assédio de grandes conglomerados estrangeiros. O consenso entre os especialistas é de que o próprio governo municipal espera que o vencedor seja um consórcio de empresas brasileiras e do exterior, possivelmente unindo a expertise paulistana com os recursos de uma grife internacional.

O escritório do arquiteto inglês Norman Foster é um dos que já procuram profissionais de São Paulo para uma dobradinha. "Uma licitação só com consórcios entre empresas brasileiras e estrangeiras é uma coisa inédita, mas acho que a experiência pode ser muito bem-vinda para São Paulo", diz o arquiteto Paulo Kawahara, da Jaime Lerner Arquitetos Associados. O arquiteto Jorge Wilheim, por exemplo, já foi procurado por um escritório europeu. Paulo Bastos, responsável pelo restauro da Catedral da Sé e da Casa das Retortas, também confirma que recebeu sondagens de algumas empresas - ele, no entanto, defende um concurso com empresas brasileiras.

"Eu acho que os escritórios do País têm qualificação suficiente para fazer esse trabalho, além de ter um conhecimento bem específico sobre a área", diz Bastos. "Os problemas mudam de um país para outro, as características das intervenções são muito diferentes. São Paulo tem peculiaridades que só nós conhecemos. Na Nova Luz, temos uma área plana, com toda a infraestrutura pronta, mas subutilizada. É preciso readequar os espaços, criar um bairro que funcione 24 horas por dia. E os arquitetos daqui têm condições de sobra para fazer essa proposta."

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Enquanto apenas a confecção de um projeto para as obras urbanísticas na Nova Luz levará pelo menos dez meses, a instalação de empresas na região, atraídas por benefícios fiscais - outra das premissas da Prefeitura para recuperar a área - também caminha a passos lentos.

Apenas duas das 23 empresas já habilitadas para receber os incentivos, desde 2007, já funcionam na Nova Luz. As demais ainda não têm previsão de mudar. Estão em fase de ter os documentos fiscais em análise pelo governo para terem os benefícios liberados. Depois, terão até dez anos para investir no centro.

Já a Secretaria de Estado da Habitação espera começar até o próximo mês a construção na antiga Cracolândia de dois prédios da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU), talvez o primeiro marco da Nova Luz. O Conselho Municipal do Patrimônio Histórico (Conpresp) aprovou no mês passado as obras dos edifícios na Rua dos Gusmões, com um total de 153 unidades, em um lugar normalmente tomado por dezenas de jovens que se reúnem para fumar crack.

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